sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Ao som dos trios – e dos tiros.

Aumentam os registros de lesões por armas de fogo no carnaval baiano e os órgãos de segurança pública aparentam reconhecer estar na criminalidade o cerne do problema.
O balanço da segurança pública no carnaval baiano não foi positivo em 2015. Em relação aos registros do ano anterior, houve, durante a folia momesca em Salvador, um expressivo aumento nas ocorrências de agressões com armas de fogo, totalizando 21, contra 3 em 2014 – um acréscimo de 600%.

Em entrevista coletiva após a festa, apresentando os dados policiais, o Secretário de Segurança Pública do Estado atribuiu o crescimento de ocorrências a uma maior participação popular e à ausência de barreiras físicas para o acesso aos circuitos. Com elas, segundo o secretário, seria possível promover uma maior fiscalização das pessoas que participam da festa, através de revista pessoal, “inibindo o bandido de levar a arma”, com receio de ser identificado. Não lhe foge razão, mas há algo mais profundo a ser analisado.

A postura do secretário tem um inegável mérito em reconhecer que é a bandidagem a responsável pelas agressões com arma de fogo. Há, aí, um desapego louvável a uma cantilena repetida à exaustão que, em época bastante recente, insistia na falácia de que a maioria dos disparos é sempre decorrente de situações passionais vividas por pessoas comuns. Nunca foram.

A questão subjacente sobre o panorama da violência no carnaval, no entanto, reside no irrefutável paralelo entre o aumento de ocorrências registradas neste ano e a acentuada curva descendente na posse legal de armas de fogo no estado. A Bahia é uma das unidades federativas de maior destaque em adesão voluntária a campanhas de desarmamento, sempre figurando entre as primeiras colocações e já chegando a liderar, por bom tempo, a relação de armas entregues por habitante. É também um dos estados com menores autorizações de compra de armas para o cidadão, onde a regra da Polícia Federal, notadamente nos últimos anos, é negar a quase totalidade dos pedidos. No entanto, não só no carnaval, a violência homicida no estado segue altíssima.

De acordo com o Mapa da Violência, levantamento que é adotado oficialmente pelo Ministério da Justiça, a taxa de homicídios na Bahia foi de 41,9 por 100 mil em 2012, ano mais recente dentre os contabilizados. Na capital, a taxa chegou a 60,6 por 100 mil. A média brasileira para o mesmo ano foi de 29 / 100 mil, seu recorde histórico. Os dados, assim, seguem reforçando a tese de que reduzir a possibilidade de acesso do cidadão comum a armas de fogo é uma estratégia fracassada de combate à violência homicida. Na Bahia das poucas armas legais, há mortes em abundância.

Definitivamente, a alegria do carnaval baiano contrasta com seu quadro recente de assassinatos. Ainda assim, as lições da festa, sobretudo as negativas, parecem, mesmo que ainda timidamente, estar sendo compreendidas e o combate à violência encontra na criminalidade seu acertado foco. Está mais do que na hora de separar rigidamente o criminoso do cidadão comum, ou quem mata de quem só morre


*  Fabricio Rebelo é pesquisador em segurança pública, bacharel em direito e coordenador regional (NE) da ONG Movimento Viva Brasil.


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